top of page

Summa Antimodernista: Compêndio de Encíclicas Papais


Índice Geral 

1. Mirari vos

1.1 Os males atuais 

1.2 Os Bispos e a Cátedra de Pedro 

1.3 Disciplina Imutável da Igreja 

1.4 Celibato Clerical 

1.5 Matrimônio Cristão 

1.6 Indiferentismo Religioso 

1.7 Liberdade de Consciência 

1.8 Liberdade de Imprensa 

1.9 Rebeldia contra o poder 

1.10 Remédio, a Palavra de Deus 

1.11 Os governantes e a Igreja 

2. Qui pluribus

3. Quanta cura

4. Quod apostolici muneris 

4.1 Os novos erros 

4.2 Causa primeira dos males: o afastamento de Deus 

4.3 Sociedades secretas; filosofismo, socialismo; outros erros. 

4.4 Doutrina católica e socialismo 

4.5 O poder: doutrina católica 

4.6 A família cristã 

4.7 Direito de Propriedade 

4.8 A religião e os governantes 

4.9 Exortação ao Episcopado

5. Aeterni patris

6. Diuturnum illud

 6.1 Doutrina católica sobre a origem da autoridade 

6.1.1 Necessidade da autoridade 

6.1.2 O poder procede de Deus 

6.2 Utilidade da doutrina católica sobre a autoridade 

6.2.1 A concepção cristã do poder político 

6.2.2 Sua realização histórica 

6.2.3 As novas teorias 

6.3 Necessidade da doutrina católica 

7. Humanus Genus

7.1 A Maçonaria 

7.2 Exortações dos Romanos Pontífices 

7.3 Confirmação dos fatos 

7.4 Conspirações de diversas seitas 

7.5 Doutrina do Naturalismo 

7.6 Perseguição contra a Sede Apostólica 

7.7 Negação dos princípios fundamentais 

7.8 Consequências políticas 

7.9 Erros e perigos 

7.10 Remédios doutrinais 

7.11 Organizações práticas 

7.12 Cuidado com a Juventude 

8. Inmortale Dei

8.1 O direito constitucional católico 

8.1.1 O poder público vem de Deus 

8.1.2 Obrigação da Sociedade para com Deus 

8.1.3 Das sociedades e dos poderes 

8.1.4 Vantagens desta concepção 

8.2 O direito constitucional moderno 

8.2.1 Princípios fundamentais 

8.2.2 Crítica deste novo direito constitucional 

8.2.3 Condenação do direito novo 

8.3 Deveres dos católicos 

8.3.1 Na ordem teórica 

8.3.2 Na ordem prática 

8.3.3 A defesa da Religião Católica e do Estado

9.Libertas praestantissimum

9.1 Doutrina católica sobre a liberdade 

9.2 Doutrina do liberalismo sobre a liberdade 

9.4 A tolerância da Igreja 

9.5 Juízo crítico sobre as distintas formas de liberalismo 

9.6 Conclusões da doutrina católica 

10. Rerum novarum

11. Pascendi Dominici Gregis 

11.1 Introdução 

11.2 Exposição das doutrinas modernistas 

11.2.1 A fé 

11.2.2 O dogma 

11.2.3 Os livros sagrados 

11.2.4 A Igreja 

11.2.5 A evolução 

11.3 Causas e remédios 

11.3.1 Remédios eficazes 

11.4 Conclusão 

12. Quadragesimo anno

12.1 Ocasião 

12.2 Tópicos principais 

12.3 Finalidade desta encíclica 

12.4 Benefícios da Encíclica Rerum Novarum 

12.4.1 A obra da Igreja 

12.4.2 Labor do Estado 

12.4.3 Labor das partes interessadas 

12.4.4 Conclusão: a Rerum Novarum, carta magna da ordem  social 

12.5 Doutrina econômica e social da Igreja 

12.5.1 Do domínio ou direito de propriedade 

12.5.2 Riqueza (capital) e trabalho 

12.5.3 A redenção do proletariado 

12.5.4 O salário justo 

12.5.5 Tríplice relação do salário 

12.5.6 Restauração da ordem social 

12.6 Mudança profunda operada depois de Leão XIII 

12.6.1 Na economia 

12.6.2 Transformação do socialismo 

12.6.3 Reforma dos costumes

13. Humani generis

13.1 Introdução 

13.2 A Igreja Católica face aos erros modernos 

13.3 Penetração dos erros modernos 

13.4 A Fé e as ciências positivas 

14. Syllabus 

14.1 Panteísmo, naturalismo e racionalismo absoluto 

14.2 Racionalismo moderado 

14.3 Indiferentismo, Latitudinarismo 

14.4 Socialismo, comunismo, sociedades secretas, sociedades  bíblicas, sociedades clérico-liberais 

14.5 Erros sobre a Igreja e seus direitos 

14.6 Erros tocantes à sociedade civil 

14.7 Erros sobre a moral natural e cristã 

14.8 Erros sobre o matrimônio cristão 

14.9 Erros sobre o principado civil do Romano Pontífice

14.10 Erros relativos ao liberalismo de nossos dias



Prólogo 

Reunimos aqui uma série de documentos através dos quais a Igreja denuncia os erros  modernistas, expondo toda a sistemática sofista moderna que já no final do século XVIII começava  a contagiar o povo católico. Encíclicas dos Papas que, com a firme intenção de salvar este  povo do ataque dos lobos e também denunciam e combatem os inimigos da Cruz, que já no  início do século XX, profundamente infiltrados na própria Igreja, desejosos de destruí-la por  dentro, ao mesmo tempo que o ataque fora dos muros se intensificou. 


Por isso, enquanto o mundo mergulha cada vez mais rápido no abismo, as palavras  daqueles sábios, fiéis timoneiros da barca de Pedro, adornados com o discernimento do  Espírito Santo e que cumpriram sua obrigação de levantar a voz, advertir e insistir contra a  má semente cujos frutos agora colhemos.  


A absoluta relevância de cada um dos textos aqui reunidos é surpreendente; e não  deveria, visto que a verdade católica sendo sempre a mesma, e não sendo outra senão aquela  revelada por Deus e aquela que se segue da mesma natureza criada, não é de surpreender que os oponentes dessa verdade apontem sempre na mesma direção, sempre oposta à  verdade. Os ímpios tomam sua constância da constância da verdade.  


Os documentos são apresentados em ordem cronológica, com exceção do Syllabus,  que, por seu caráter mais de catálogo do que de discurso, preferimos colocar no final. A esta  ordem cronológica podem sobrepor-se várias 'ordens lógicas', e até uma ordem pedagógica  que aconselha quais documentos ler antes, quais depois. Uma vez que a ordem cronológica  está estabelecida, vamos esboçar uma ordem lógica.  

Em primeiro lugar, há um conjunto de documentos que denunciam de forma mais  geral os erros modernos. São eles Mirari Vos, Qui Pluribus e Quanta Cura. Pascendi merece  uma menção especial, pois é uma exposição mais ordenada tanto dos erros quanto de sua  refutação, e se tornou uma referência central ao longo do tempo.  

Temos então dois grupos de documentos: os mais inclinados à reafirmação de  princípios sólidos e os mais propositados a denunciar erros concretos. Entre os primeiros  temos Aeterni Patris, Libertas praestantissimum, Rerum Novarum e Diuturnum Illud; entre  os últimos, Humanus Genus e Quod apostolici muneris. Dois documentos mais modernos  são Quadragesimo anno, uma atualização da Rerum Novarum e Humani Generis, sobre as  falsas opiniões em torno da doutrina católica.  


Não incluímos muitos outros documentos nesta compilação, para não torná-la mais  espessa do que o necessário. 


Mais de um desses documentos trata especificamente da pestilência socialista e  maçônica. Hoje todas as forças do mal convergem contra a Igreja:  socialismo, maçonaria, capitalismo, islamismo, seitas, instituições internacionais,  parlamentos nacionais, a grande maioria dos meios de formação do povo-rebanho, como a  imprensa e televisão, etc. 


Muitas outras coisas poderiam ser ditas, mas é preferível agora que nos calemos e que  o leitor se volte para as palavras contidas nesta compilação: palavras sábias, verdadeiras,  vigorosas porque não perderam sua relevância. Que o leitor vá até lá e cumpra suas  obrigações de católico, que não se limitam à prática dos sacramentos, mas o obrigam a  combater o bom combate da Fé. E para combatê-lo é preciso discernir e conhecer,  compreender e refletir.


1. Mirari Vos – Papa Gregório XVI 

Carta Encíclica Mirari vos de S.S. Gregorio XVI sobre os erros modernos 


Carta Encíclica a todos os Patriarcas, Primazes, Arcebispos e Bispos do Orbe Católico:  sobre os principais erros de seu tempo. 

Veneráveis irmãos, 

Saúde e Bênção Apostólica. 


A Rebelião dos ímpios, causa de seu silêncio 

1. Creio-vos admirados, porque desde que sobre Nós pesa o cuidado da Igreja  universal, ainda não vos dirigimos Nossas cartas, como o costume arraigado da Igreja e  Nossa benevolência para convosco o reclamam. Mui veemente era, em verdade, o desejo de  abrir-vos Nosso coração e, ao comunicar-vos Nossa palavra, fazer-vos ouvir aquela mesma  voz, pela qual Nos foi ordenado, na pessoa de Pedro, confirmar nossos irmãos (Lc 22,23).  Mas bem sabeis que a procela de males e aflições que nos combateu desde os primeiros  momentos de Nosso pontificado, ergueu-se, subitamente, qual vagalhão tão impetuoso que,  se não Nos deplorais qual náufrago da terrível conspiração dos ímpios é mercê de um esforço  da onipotência divina. Com o coração alanceado pela tristíssima consideração de tantos  males, não se tem ânimo para relembrar tamanha amargura; preferimos, pois, bendizer ao  Pai de toda consolação que, humilhando os perversos, Nos livro do presente perigo e,  acalmando a turbulenta tempestade, Nos permitiu respirar. Então Nos propusemos a dar vos conselhos para pensar as chagas de Israel, mas o grande número de cuidados que pesou  sobre Nós, enquanto conciliávamos o restabelecimento da ordem pública, foi causa de mais  tardança. A insolência dos ímpios que tentaram, de novo, arvorar a bandeira da rebelião, foi  novo motivo de Nosso silêncio. E Nós, ainda que com tristeza indizível, vimo-Nos obrigado  a reprimir, com pulso firme, (1 Cor 4,21), a contumácia daqueles homens, cujo furor se  exaltava de mais a mais, longe de se abrandar pela constante impunidade e pela Nossa 

clemência. E desde então podeis muito bem deduzir que Nossos cuidados se tornaram mais  constantes. 

Mas, havendo já tomado posse do pontificado na Basílica de Latrão, consoante  costume estabelecido por Nossos maiores, e que fora retardada pelas causas supraditas, sem  dar azo a mais delongas, damo-Nos pressa em dirigir-vos a presente carta, testemunho de  Nosso afeto para convosco, neste dia gratíssimo, em que celebramos a solene festa da  gloriosa Assunção da Santíssima Virgem, a fim de que aquela que Nos foi protetora e  salvadora em gravíssimas calamidades, Nos seja propícia, iluminando-Nos o intelecto com  celeste inspiração, para dar-vos os conselhos mais conducentes à santificação da grei cristã. 

1. 1 Lamentação dos males atuais 

2. Em verdade, triste e com o coração dolorido, dirigimo-Nos a vós, a quem vemos  cheios de angústia, ao considerar a crueldade dos tempos que fluem para com a religião que  tanto estremeceis. Na verdade, poderíamos dizer que esta é a hora do poder das trevas para  joeirar como o trigo, os filhos de escol (Lc 22,53); 'a terra ficou infeccionada pelos seus  habitantes, porque transgrediram as leis, mudaram o direito, romperam a aliança eterna' (Is  24,5). Referimo-Nos, Veneráveis Irmãos, aos fatos que vedes com vossos próprios olhos e  todos choramos com as mesmas lágrimas. A maldade rejubila alegre, a ciência se levanta  atrevida, a dissolução é infrene. Menospreza-se a santidade das coisas sagradas, e o culto  divino, que tanta necessidade encerra, não é somente desprezado, mas também vilipendiado  e escarnecido. Por esses meios é que se corrompe a santa doutrina e se disseminam, com  audácia, erros de todo gênero. Nem as leis divinas, nem os direitos, nem as instituições, nem  os mais santos ensinamentos estão ao abrigo dos mestres da impiedade. 

Combate-se tenazmente a Sé de Pedro, na qual pôs Cristo o fundamento de sua Igreja;  forçam-se e rompem-se, momentaneamente, os vínculos da unidade. Impugna-se a  autoridade divina da Igreja e, espezinhados os seus direitos, é submetida a razões terrenas;  com suma injúria, fazem-na objeto do ódio dos povos, reduzindo-a a torpe servidão. O  clamoroso estrondo de opiniões novas ressoa nas academias e liceus, que contestam  abertamente a fé católica, não já ocultamente e por circunlóquios, mas com guerra cura e  nefária; e, corrompidos os corações dos jovens pelos ensinamentos e exemplo dos mestres,  cresceram desproporcionadamente o prejuízo da religião e a depravação dos costumes. Por  isso, rompido o freio da religião santíssima, somente em virtude da qual subsistem os reinos  e se confirma o vigor de toda potestade, vemos campear a ruína da ordem pública, a desonra  dos governantes e a perversão de toda autoridade legítima; e a origem de tantas calamidades 

devemos buscá-la na ação simultânea daquelas sociedades, nas quais se depositou, como em  sentina imensa, quanto de sacrilégio, subversivo e blasfemo acumularam a heresia e a  impiedade em todos os tempos. 

1.2 Para corrigi-los, os Bispos devem trabalhar unidos à Cátedra de  Pedro 

3. Estas coisas, Veneráveis Irmãos, e outras muitas, talvez de maior gravidade, que  seria prolixo referi-las e que vós conheceis perfeitamente, Nos obrigam a experimentar dor  amarga e constante, pois, constituído na Cátedra do Príncipe do Apóstolos, é mister que o  zelo pela casa de Deus Nos consuma. E sabedores, em razão de Nosso múnus, de que não é  suficiente deplorarem-se tantos males, mas que se faz necessário remediá-los com todas as  nossas forças, recorremos à vossa fé e imploramos a vossa solicitude pela grei católica,  Veneráveis Irmãos, porque a vós cabe a virtude e a religião, a singular prudência e  constância, que Nos encorajam e consolam em meio a tantas desgraças. 

A Nós toca o dever de levantar a voz e envidar todos os esforços, para que o javali não  destrua a vinha e o lobo não destroce o rebanho; devemos dar-lhes pábulo tão salutar, que  nem de leve sequer sejam suspeitos. Longe de Nós, e mui longe, que os pastores faltem ao  seu dever, abandonando covardemente as ovelhas, quando tantos males nos afligem e tantos  perigos nos cercam, e que, sem cuidar da grei, se manchem com o ócio e a negligência.  Façamos, pois, causa comum, digo melhor, a de Deus e, de espírito uno, porfiemos contra o  inimigo comum, com uma só intenção com um só esforço. 

4. Tudo isto cumprireis plenamente, se, segundo vosso dever, cuidardes de vós  mesmos e da doutrina, tendo sempre presente que a Igreja universal repele toda novidade  (S. Caelest. PP., ep. 21 ad episc. Galliar.) e que, conforme conselho do Pontífice Santo Agatão,  nada se deve tirar daquelas coisas que hão sido definidas, nada mudar, nada acrescentar,  mas que se devem conservar puras, quanto à palavra e quanto ao sentido (Ep. ad imp. apud  Labb. Tomo II, p. 235, Ed. Mansi). Daqui surgirá a firmeza da unidade, que se radica, em  seu fundamento, na Cátedra de Pedro, a fim de que todos encontrem baluarte, segurança,  porto bonançoso e tesouro de inumeráveis bens, justamente onde as Igrejas possuem a fonte  de seus direitos (S. Inocêncio. Papa, ep. II, apud Constat.). Para reprimir, portanto, a audácia  dos que ora intentam infringir os direitos desta Sé, somente na qual se apoiam e recebem  vigor, preciso é incular um profundo sentimento de fidelidade e veneração para com ela, 

clamando, a exemplo de São Cipriano, que em vão protesta estar na Igreja o que abandonou  a Cátedra de Pedro, sobre a qual está fundada (S. Cypr., De unitate eccles.). 

5. Deveis, pois, trabalhar e vigiar assiduamente, para guardar o depósito da fé, apesar  das tentativas dos ímpios, que se esforçam por dissimulá-lo e desvirtuá-lo. Tenham todos  presente que o julgar da sã doutrina, que os povos têm de crer, e o regime e o governo da  Igreja universal é da alçada do Romano Pontífice, a quem foi dado por Cristo pleno poder,  para apascentar, reger e governar a Igreja universal, segundo os ensinamentos legados pelos  Padres do Concílio de Florença (Sess. 25, in definit. apud Labb., tom. 18, col. 527. Edit.  Venet.). Portanto, todo Bispo deve aderir fielmente à Cátedra de Pedro, guardar o depósito  da fé santa e apascentar religiosamente o rebanho de Deus que lhe foi confiado. Os  presbíteros estejam sujeitos aos Bispos, considerando-os, segundo aconselha São Jerônimo,  como pais da alma (Ep. 2 ad Nepot., a. 1, 24); e jamais esqueçam que os cânones mais antigos  lhes vedam o desempenho de qualquer ministério, o ensino e a pregação sem licença do  Bispo, a cujo cuidado foi condiado o povo e de quem se hão de pedir contas das almas (Ex  can., app 33 apud Labb., tomo I, p. 38, edt. Mansi.). Por fim, tenha-se por certo e estável  que, quantos intentarem contra esta ordem estabelecida, enquanto depender de sua parte,  perturbam o estado da Igreja. 

1.3 Imutabilidade da doutrina e disciplina da Igreja 

6. Reprovável seria, na verdade, e muito alheio à veneração com que se devem acolher  as leis da Igreja, condenar, somente por néscio capricho de opinião, a doutrina que foi por  ela sancionado, na qual estão contidas a administração das coisas sagradas, a regra dos  costumes e dos direitos da Igreja, a ordem e a razão dos seus ministros, ou então acoimá-la  de oposicionista a certos princípios de direito natural, julgando-a deficiente e imperfeita, ou  ainda sujeitando-a à autoridade civil. 

Constando, com efeito, como reza o testemunho dos Padres do Concílio de Trento  (Sess. 13, dec. de Eucharistia in proœm.), que a Igreja recebeu sua doutrina de Jesus Cristo  e dos seus Apóstolos, e que o Espírito Santo a está continuamente assistindo, ensinando-lhe  toda a verdade, é por demais absurdo e altamente injurioso dizer que se faz necessária uma  certa restauração ou regeneração, para fazê-la voltar à sua primitiva incolumidade, dando 

lhe novo vigor, como se fosse de crer que a Igreja é passível de defeito, ignorância ou outra  qualquer das imperfeições humanas; com tudo isto pretendem os ímpios que, constituída de  novo a Igreja sobre fundamentos de instituição humana, venha a dar-se o que São Cipriano 

tanto detestou: que a Igreja, coisa divina, se torne coisa humana (Ep. 52, edit. Baluz.).  Pensem, pois, os que tal supõem, que somente ao Romano Pontífice como atesta São Leão,  tem sido confiada a constituição dos cânones; e que somente a ele, que não a outro, compete  julgar dos antigos decretos dos cânones, medir os preceitos dos seus antecessores para  moderar, após diligente consideração, aquelas coisas, cuja modificação é exigida pela  necessidade dos tempos (Ep. ad. episc. Lucaniae). 

1.4 Defesa do celibato clerical 

7. Reclamamos, aqui, também a vossa invicta constância para combater a torpíssima  conspiração que se tem tramado contra o celibato clerical, a qual, como sabeis, cresce de  momento para outro, porque com os falsos filósofos do nosso século fazem coro alguns  eclesiásticos que, esquecidos da sua dignidade e estado, e aliciados pela voluptuosidade,  chegaram a licenciosidade tal, a ponto de em alguns lugares se atreverem a pedir  publicamente faculdade aos príncipes para infringir tão santa disciplina. Mas causa-nos  rubor falar extensamente de intentos tão torpes e, confiado em vossa piedade, pedimo-vos  que, com todas as forças e apoiados nas prescrições dos sagrados cânones, custodieis,  defendais, e vindiqueis, em toda sua integridade, aquela lei de tamanha gravidade, contra a  qual os inimigos assestam seus dardos. 

1.5 Matrimônio cristão 

8. Reclama também nosso especial cuidado aquela união santa dos cristãos, chamada  pelo Apóstolo sacramento grande em Cristo e na Igreja (Ef 5,33; Heb 13,4), para que não se  diga e nem se tente dizer algo quer contra a santidade quer contra a força indissolúvel deste  vínculo. O mesmo Nos recordara Nosso antecessor Pio VIII, de santa memória, com não  pouca insistência; mão obstante, seus esforços não foram bastantes para sustar todo o mal.  Devemos, pois, ensinar aos povos que o matrimônio, legitimamente contraído, já não pode  ser dissolvido, e que os unidos pelo matrimônio forma, por vontade de Deus, sociedade  perpétua com vínculos tão íntimos que só a morte os pode dissolver. Tenham presente que  o matrimônio pertence às coisas sagradas, e está sujeito à Igreja; tenham-se presentes as leis  que sobre ele há ditado a Igreja; obedeçam-lhe santa e escrupulosamente, pois dela  dependem a eficácia, força e justiça da união. Não admitam, de forma alguma, algo que  esteja em oposição aos sagrados cânones ou aos decretos dos concílios, pois não  desconhecem o mau resultado que necessariamente hão de acarretar as uniões que se fazem 

contra a disciplina da Igreja, sem implorar a proteção de Deus, somente por leviandade, sem  pensar no sacramento e nem nos mistérios que nele são significados. 

1.6 Condenação do indiferentismo religioso 

9. Outra causa que tem acarretado muitos dos males que afligem a Igreja é