Pelo Rev. Pe. Damien Dutertre
Este artigo foi publicado originalmente na língua inglesa em junho de 2022 no site do Seminário da Santíssima Trindade:
https://mostholytrinityseminary.org/wp-content/uploads/2022/06/Lack_of_Intention_Dutertre_2022.pdf
Este capítulo articula o argumento da Tese que explica porque os "papas do Vaticano II" não são verdadeiros papas, a saber, porque lhes falta a intenção adequada exigida a um ato válido de aceitação do papado.

1. Introdução.
A primeira edição do Cahiers de Cassiciacum (publicado pela Associação Saint- Herménégilde, Nice, maio de 1979) discute em profundidade o tema da intenção. Em uma seção contando cerca de 52 páginas, o Bispo Guérard des Lauriers, O.P. explica como um homem que, apesar de exteriormente aparentar ser o papa, poderia internamente apresentar um obstáculo para receber de Cristo a forma do papado. Em outras palavras, enquanto que em circunstâncias normais, nada impediria que Nosso Senhor concedesse ao candidato eleito as chaves de São Pedro e a autoridade suprema sobre a Igreja, nas circunstâncias atuais, algo na intenção do candidato eleito impede que ele receba essa autoridade suprema. A seguir faremos uma apresentação deste argumento.
2. Os "papas do Vaticano II" na realidade não são papas verdadeiros.
A Tese concorda com o sedevacantismo total (às vezes chamado "totalismo") ao dizer
que os papas do Vaticano II não são papas verdadeiros. Este é um fato admitido por ambos.
Os papas do Vaticano II, que aparentavam ter autoridade suprema sobre a Igreja, promulgaram universalmente erros de doutrina, liturgia e disciplina; eles o fizeram em circunstâncias em que a indefectibilidade da Igreja em doutrina, culto e disciplina estava engajada. Portanto, ou eles não são papas, ou a Igreja falhou. Como a fé católica nos proíbe de professar a segunda alternativa, a primeira deve ser verdadeira.
3. Explicação dada pelo "sedevacantismo total".
Onde a Tese discorda do totalismo está na explicação de como esses falsos papas não são papas verdadeiros. O totalismo inicia com uma tentativa de estabelecer um fato de heresia pública entre os "papas do Vaticano II". Ele continua afirmando que um herege público não pode ser validamente eleito ao papado, e conclui que os "papas do Vaticano II" foram invalidamente eleitos ao papado.
4. Explicação dada pela Tese.
A Tese apresenta um argumento totalmente diferente, baseado em considerações metafísicas do ato de aceitação do papado e da natureza da autoridade. Estes são dois argumentos completamente distintos. Os aderentes da Tese rejeitam o argumento totalista como falso. A razão para isso é que o Direito Canônico indica claramente que hereges não declarados podem validamente eleger e ser eleitos na Igreja, ao menos enquanto seu delito de heresia não for reconhecido (isto será minuciosamente estudado em seu próprio capítulo).
Por sua vez, o argumento apresentado pelo Bispo des Lauriers pode ser resumido brevemente assim: para se tornar o papa e receber a autoridade de Cristo, o eleito deve aceitar verdadeiramente o papado.
Este argumento é, portanto, próprio à Tese: Os "papas do Vaticano II" não são papas verdadeiros por conta do fato de não terem aceitado adequadamente sua eleição ao papado.
PRIMEIRO ARTIGO
MATÉRIA E FORMA NO PAPADO
5. Elementos envolvidos na criação de um papa.
Consideremos as determinações necessárias que são reunidas na pessoa de um papa. O Código de Direito Canônico de 1917, pode. 219, indica:
“O Romano Pontífice, legitimamente eleito, tão logo quanto ele aceita a eleição, recebe por lei divina, o pleno poder de jurisdição suprema.”
Há, portanto, três elementos que sustentam a afirmação que alguém é o papa:
1.eleição legítima
2.aceitação da eleição pela pessoa eleita
3.o pleno poder da jurisdição suprema, recebido diretamente de Cristo.
Estes três elementos têm causas distintas: a eleição é feita pelos eleitores; a aceitação é dada pela pessoa eleita; e o poder supremo lhe é comunicado por Deus.
Podemos, portanto, distinguir claramente as três etapas da formação de um papa. Primeira, um grupo de homens (o colégio de cardeais) elegem legalmente um candidato. Segunda, este candidato aceita o papado. Terceira, Deus confere ao homem eleito a suprema autoridade sobre a Igreja, tornando-o assim o papa.
6. Matéria e forma no papado.
Os teólogos que descreveram este processo utilizaram os termos análogos de matéria e forma, que no homem, por exemplo, são o corpo e a alma, respectivamente. Estes termos têm sido aplicados analogamente por filósofos e teólogos para fazer distinções na esfera da moralidade humana. A aplicação destes conceitos (matéria, forma) à teologia sacramental, por exemplo, é bastante conhecida.
Na administração do sacramento do batismo, a lavagem com água na testa é a matéria do sacramento: ela poderia se tornar um sacramento, se fosse dita a forma, a fórmula do batismo, para determinar que essa lavagem não é uma mera limpeza, mas o sacramento do batismo.
Assim também, na teologia moral diz-se que algo é um pecado material se for objetivamente errado. Torna-se um pecado formal se foi intencionalmente pretendido. Por exemplo, comer carne na sexta-feira é objetivamente errado, é um pecado material, é a matéria do pecado, e de fato será um pecado, um pecado formal, se foi feito deliberadamente. Mas se alguém comesse carne na sexta-feira por engano, seria apenas um pecado material, o que não é um pecado de maneira alguma e não precisa ser confessado.
No caso do papa, os teólogos também fizeram uma distinção entre o sujeito (a pessoa) recebendo o papado, e a própria autoridade do papado, descrevendo o primeiro como a matéria do papa, enquanto a segunda é a forma do papado. Pelo processo de eleição e aceitação, um sujeito (a matéria) é preparado e disposto a receber de Deus a forma do papado, ou seja, a suprema autoridade sobre a Igreja. A união desta matéria e desta forma produz um papa válido.
São Roberto Bellarmino (De Romano Pontifice, Bk. II, c. XXX) escreve:
“Portanto, quando os Cardeais criam o Pontífice, eles exercem sua autoridade não sobre o Pontífice, porque ele ainda não existe; mas sobre a matéria, ou seja, sobre a pessoa em quem eles dispõem em certa medida através da eleição, para que ele possa receber a forma do pontificado de Deus.”
A mesma distinção é feita por Santo Antonino e pelo Cardeal Caetano. É portanto falso afirmar, como muitos têm feito, que a Tese é uma novidade na aplicação destas distinções ao papado.(1)
(1) E mesmo que, por hipótese, nenhum teólogo o tivesse feito anteriormente, isso não invalidaria a Tese meramente por isso. A ciência da teologia tem sido desenvolvida ao longo dos séculos por teólogos que lentamente têm aprofundado nossa compreensão da fé. Cada passo nesse desenvolvimento, nesse sentido, poderia ser acusado de ser uma "novidade". Esta atitude, encontrada entre alguns, de recusar-se a meditar e analisar teologicamente a crise atual é profundamente alarmante. Ela é contrária à vida da fé, que deve permear toda nossa vida, e particularmente nossa mais alta faculdade, que é nosso intelecto. Muitos católicos querem encontrar uma "citação" de algum teólogo anterior descrevendo inteiramente nossa situação. Não há nenhuma, além dos escritos de Dom Guérard des Lauriers. A situação atual jamais foi imaginada nem mesmo especulativamente por nenhum teólogo antes do Concílio Vaticano II. Portanto, não se deve tentar ler os trabalhos dos teólogos do passado como se eles estivessem comentando a crise atual na Igreja. Fazer tal leitura seria tirá-los do contexto. Ao invés disso, deve-se entender os princípios universais ensinados perenemente pelos teólogos aprovados pela Igreja, a fim de aplicá-los harmoniosamente à crise atual. Como observou Dom Guérard des Lauriers: "A teologia, ao menos às vezes, consiste em pensar, e não meramente em repetir". Nesta apresentação da Tese, no entanto, nós propositalmente apelamos a muitos teólogos aprovados que estudaram casos similares, para mostrar que, se a Tese não pode ser inteiramente encontrada, como um todo, nas especulações de teólogos do passado, seus princípios, no entanto, são comuns na teologia tradicional.
É também claramente falso dizer que ao conceder aos "papas do Vaticano II" um aspecto material do papado, a Tese está na realidade concedendo-lhes poder e autoridade. Da mesma forma que lavar a testa não é batismo, ou que comer carne na sexta-feira por engano não é pecado, um papa material (uma pessoa eleita ao papado) não é papa. Entretanto, assim como não se pode conferir o batismo sem o elemento material da lavagem com água; ou assim como não se pode ter um pecado a menos que haja algo objetivamente, materialmente, pecaminoso (ao menos como percebido pela pessoa), assim também não se pode jamais ter um papa real (formal) a menos que se tenha, primeiro, uma matéria disposta a receber o papado, ou seja, um homem eleito pelo conclave.
7. Matéria e forma do papado na ausência de um papa.
Quando o papa morre, diz-se assim que o papado permanece sob seu aspecto material na capacidade da Igreja de eleger um sucessor, e sob seu aspecto formal em Cristo, pronto para conferir autoridade ao eleito. Tal é o ensinamento de Santo Antonino (1389-1459):
“Tal poder [papal] permanece na Igreja e no Colégio [dos Cardeais] com respeito ao que é material no papado, já que após a morte do papa o Colégio é capaz, através de uma eleição, de determinar uma pessoa para o papado, que seja tal ou qual pessoa. …Portanto, se pelo nome de papado entendemos a eleição e determinação da pessoa (que é a coisa material no papado, como já foi dito anteriormente) então tal poder permanece no Colégio após a morte do papa. Mas se pelo nome de poder papal entendemos sua autoridade e jurisdição (que é a coisa formal), então tal poder nunca morre, porque permanece sempre em Cristo.” (2)
(2) Santo Antonino de Florença, Summa Sacrae Theologiae, Juris Pontificii et Caesarei, Tertia Pars, Tl. 21, Venetiis 1581.
Enquanto estes dois aspectos do papado permanecerem: o aspecto material na Igreja, e o aspecto formal em Cristo, o papado não se perde. Também não é negado o ensinamento do Concílio Vaticano de 1870, que ensina que São Pedro terá sucessores perenes.
Esperar que Cristo providencie não apenas o aspecto formal do papado, que é a autoridade suprema do papa, mas também seu aspecto material, que é a designação de um homem para receber o papado, obrigaria logicamente em admitir a perda de apostolicidade na Sé Romana e na Igreja universal. Pois mesmo se um papa fosse nomeado diretamente do céu, ele não seria o verdadeiro sucessor de São Pedro. Por analogia, um homem criado diretamente de Deus sem ser procriado por pais humanos não poderia ser um descendente de Adão. Portanto, qualquer sistema incapaz de explicar a continuação do aspecto material do papado na Igreja deve ser abandonado.
8. A Tese sustenta que os “papas do Vaticano II" não são papas formalmente, mas apenas materialmente.
Isto será provado posteriormente. Que seja suficiente, por ora, explicar seu significado. A Tese diz que os "papas do Vaticano II" não são formalmente papas, ou seja, não são realmente papas e não têm autoridade. No entanto, a Tese diz que eles são papas materialmente, o que significa que receberam um dos aspectos do papado: a eleição. Uma pessoa eleita para ser papa não é papa, certamente, assim como uma mera lavagem da testa não é batismo. Mas assim como a água derramada na cabeça de uma pessoa poderia ser transformada no sacramento do batismo, se alguém pronunciasse as palavras do batismo, assim também uma pessoa eleita ao papado poderia ser feita em um verdadeiro papa se ele aceitasse o papado e recebesse de Deus a autoridade.
SEGUNDO ARTIGO
A DISPOSIÇÃO FINAL DA MATÉRIA: A ACEITAÇÃO
9. A aceitação da eleição.
Por sua natureza, o intelecto procura conhecer a essência de uma realidade da qual ele capta a existência. Ora, a ausência de autoridade nos papas do Vaticano II é sabida como um fato, como já explicamos, mas ainda não se entende a forma pela qual essa falta de autoridade é trazida à existência.
Sabemos como um fato que os "papas do Vaticano II", apesar das eleições aparentemente válidas, não receberam a autoridade suprema de Cristo. Isso é possível? A resposta está no afirmativo, pois entre uma eleição legítima e a recepção da autoridade de Deus é necessário um ato intermediário, como vimos: a aceitação da eleição por parte da pessoa eleita. Este é um ato da vontade, por parte do eleito, que deve ser manifestado externamente, mas por sua própria natureza também precisa ser interno para ser válido.
Em outras palavras, é necessário que o eleito tenha e expresse com sinceridade sua aceitação da eleição. Por um simples ato da vontade, portanto, o eleito pode optar por receber a autoridade suprema da Igreja, ou recusá-la. Ele também pode aceitá-la por algum tempo, e depois renunciá-la voluntariamente; o Papa São Celestino (que reinou entre julho e dezembro de 1294) é um exemplo bem conhecido disto. Este simples ato da vontade é chamado de aceitação. Diz-se que é a disposição final da matéria, no sentido de que é a última preparação necessária por parte do homem para que alguém possa receber a autoridade pontifical de Deus.
10. A função da aceitação.
De acordo com Bonacina,(3) aceitação não significa que o papa se constitui como um papa, ou que junta o papado a si mesmo, “porque o consentimento à eleição não é a eleição ou criação ou constituição de um papa, mas uma condição necessária para o efeito completo da eleição e da constituição de um papa.”(4)
O Cardeal Caetano (5) ensina similarmente:
“Desde a instituição imediata do primeiro "Pedro" por Cristo Ele mesmo, a união entre o papado e Pedro não vem de Deus, mas do homem. Isto se torna evidente pelo fato de que esta união é produzida por intermédio de uma eleição humana. Dois atos humanos de consentimento contribuem para este efeito, a saber, o dos eleitores e o do eleito. É de fato necessário que os eleitores elejam voluntariamente, e que o eleito aceite a eleição voluntariamente, pois de outra forma nada acontece.“ (6)
(3) Martin Bonacina (1585-1631) foi teólogo, bispo auxiliar de Praga e bispo titular de Utica. Ele é um dos poucos teólogos a ter dedicado todo um tratado à análise completa da eleição do papa.
(4) Bonacina, Tractatus de Legitima Summi Pontificis Electione, Venetiis 1638, Apud Petrum Turrinum, pp. 50-53.
(5) Tommaso de Vio Gaetani Caetano (1469- 1534) foi um cardeal dominicano, filósofo, teólogo e exegeta. Ele é um dos maiores comentadores da obra de São Tomás de Aquino.
Passerini (7) explica:
“O eleito não é papa exceto após seu consentimento, e em virtude do consentimento, que por natureza precede o Pontificado.” (8)
Bonacina diz novamente em termos equivalentes (ibid.):
“A quarta condição é que a pessoa eleita consinta. A razão para isto é, primeiro, que ninguém pode começar a possuir algo de maneira moral sem seu consentimento; portanto, para que alguém comece a possuir o papado ou o poder Pontifical, seu consentimento é necessário. Também, porque pela atribuição do papado a pessoa eleita recebe muitas obrigações, e é obrigada como que por um contrato (quasi ex contractu); mas uma obrigação de um contrato ou quase-contrato não é recebida sem consentimento, como Caetano corretamente diz no capítulo 26 de seu primeiro livro De Comparatione Papae et Concilii.”
(6) Caetano, De Comparatione Auctoritatis Papae et Concilii, capítulo XX. Ênfase acrescentada.
(7) O Rev. Peter Mary Passerini O.P. é um tomista proeminente do século XVII, cujas obras continuaram a ser estudadas nos séculos seguintes. Ele também foi o vigário geral da ordem Dominicana. Ele é um dos poucos teólogos que escreveu um tratado inteiro dedicado à análise completa da eleição do papa. O Pe. Garrigou-Lagrange O.P. o elogia muito e o segue, por exemplo, na questão do que formalmente constitui a perfeição cristã. Em sua obra “Perfeição cristã e Contemplação'', o Pe. Garrigou-Lagrange refere-se a ele como "o grande canonista Passerini, O.P., que foi um profundo teólogo e muito fiel a São Tomás".
(8) Passerini, Tractatus de Electione Papae, Roma, 1670, p. 155.
11. Intervalo entre a eleição e a aceitação.
No intervalo entre a eleição e a aceitação, apenas o eleito tem o aspecto material do papado (ainda precisando ser concluído pela aceitação), mas não ainda o aspecto formal. A duração deste intervalo é passível de ser determinada pelos eleitores, mas em si mesma é indefinida.
Bonacina explica novamente (ibid.):
“Uma dificuldade maior é se o Colégio dos Cardeais tem algum poder sobre a pessoa eleita, que ainda não aceitou a eleição. Parece-me que se deve responder com Sopranus (no local supracitado) que eles têm o poder de mandá-lo que aceite a eleição o mais rápido possível, ou que ele a recuse, se não estiver disposto a aceitá-la. A razão é que durante a vacância da Sé todo o Colégio tem poder sobre cada um dos Cardeais, ao menos quanto às coisas que dizem respeito à eleição, [como pode ser visto] no capítulo supracitado Ubi Periculum: portanto ele (o Colégio dos Cardeais) pode forçar o eleito a aceitar a eleição ou a recusá-la, se ele não estiver disposto a aceitá-la.”
12. Diferentes alternativas são possíveis no intervalo entre a eleição e a aceitação.
Na verdade, o eleito pode ou aceitar a eleição, ou recusar a eleição, ou não fazer nenhuma das duas. Em caso de aceitação, ele se torna um verdadeiro papa. No caso de recusa, ele volta ao estado em que estava antes da eleição, e outra pessoa pode, e deve, ser eleita em seu lugar. No caso de não aceitar nem recusar, o que é mais interessante, ele permanece sendo o eleito do conclave sem ainda ser um verdadeiro papa, dotado de autoridade suprema, enquanto ele não tomar uma decisão.
A situação atual do papado, como explicaremos, está entre alguém que verdadeiramente aceitou e alguém que não aceitou nem recusou: os eleitos de facto aceitaram exteriormente (como é evidente), mas não internamente (como provaremos).
A situação durante este intervalo não é, portanto, de pura vacância da Sé romana. Novamente, Bonacina o diz em termos claros (ibid., ênfase adicionada):
“Em segundo lugar, não se segue que a Sé Apostólica esteja simplesmente (simpliciter) vacante enquanto a eleição houver sido feita pelos Cardeais e a pessoa eleita ainda não houver dado seu consentimento, como quando a pessoa eleita é um Cardeal ausente (como se sucedeu com Adriano VI que estava na Espanha em 1521), pois mesmo que a eleição ainda não tenha alcançado seu pleno efeito e ainda não se diga que a Sé Apostólica tenha sido ocupada, enquanto não se seguir o consentimento da pessoa eleita; mas a Sé Apostólica não está vacante por conta disso, porque *se diz que a Sé está vacante quando não há um Pontífice de nenhuma maneira, mas em nosso caso há um Pontífice de certa maneira, já que um Papa já foi eleito, e mesmo que ele ainda não tenha sido criado, ele foi, no entanto, como que concebido e existe, por assim dizer, no ventre.*”
A última determinação da matéria, preparada para receber a forma do papado, é, portanto, o consentimento interno do eleito. Mesmo no caso de uma eleição legítima, e garantida a promessa de Cristo de conceder autoridade ao legítimo sucessor de São Pedro, a última condição ainda precisa ser cumprida para a validade: uma sincera aceitação interna do papado por parte do eleito.
13. Pode-se dizer que os "papas do Vaticano II" são papas materialmente.
Com isto não se pretende que eles sejam realmente papas, já que, em última análise, a forma do papado é o que faz um homem ser o papa, como já vimos. Mas o eleito de um conclave tem algum elemento material do papado, ou seja, alguma disposição para receber o papado, que nenhum outro homem na terra tem.
Em última análise, a matéria próxima do papado, pronta para receber de Deus a forma do papado, requer o consentimento do eleito. Mas o eleito é remotamente a matéria do papado, assim como a água é a matéria remota do batismo. O que será feito com esta matéria determinará se um papa é criado, ou se um batismo é conferido.
As distinções são assim resumidas pelo beneditino Charles Bachofen:
“A eleição é, poderíamos dizer, o elemento material remoto, enquanto o consentimento do eleito é matéria próxima, à qual se acrescenta a forma divina da primazia incorporada no bispo Romano.”(9)
Seguindo esta distinção, fica claro que é legítimo falar de um papa eleito como tendo algum aspecto material do papado, ou seja, o elemento material remoto, a eleição. Por isso a Tese diz que embora os "papas do Vaticano II" não sejam formalmente papas (eles não têm o papado que vem de Deus), ainda assim eles podem ser considerados papas materiais (eles foram eleitos pelos homens).
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