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Tese de Cassiciacum e os Fraticelli: Os erros do passado sendo cometidos no presente

O propósito deste artigo é mostrar que reações extremas aos erros, na maioria das vezes, se tornam heresias. Para este fim, dilucidaremos certos ocorridos na História da Igreja.





Os Fraticelli


A heresia dos Fraticelli ou Espirituais, que contaminou os melhores elementos da Ordem franciscana logo em seu início, foi causada pelos abusos do Superior Geral que o próprio São Francisco, na hora de sua morte, em 3 de outubro de 1226, indicou como Vigário ou Ministro Geral, para sucedê-lo no governo da Ordem dos Frades Menores: Frei Elias de Cortona.


Este Frei Elias tomou a direção da Ordem, desviando-se logo da Regra, que estabelecia uma pobreza rigorosa para os frades do Santo de Assis. Frei Elias admitiu andar de carruagem puxada por cavalos bem ajaezados, quando São Francisco estipulara que os frades deveriam andar sempre a pé. Elias aceitou grandes donativos e fez com que a Ordem perdesse a pobreza inicial que a caracterizava. Ademais, fez política agradando os grandes de seu tempo, e perseguiu os frades que queriam manter-se fiéis ao ideal da pobreza dado e pregado por São Francisco. Os frades mais virtuosos, os que melhor imitavam o fundador, eram os mais perseguidos.


Frei Elias aderiu ao Imperador Frederico II, conhecido inimigo da Igreja. Seus adversários na Ordem o acusaram até de praticar a Alquimia. Ele morreu em 1253, fora da Ordem, mas reconciliado com Igreja que o excomungara.


A luta entre os partidários de Frei Elias e os seus inimigos vai ser a fonte de uma divisão, que terminará com a formação da seita dos Fraticelli, que por reação contra o laxismo dos partidários de Frei Elias, acabou por cair em heresia, com o grupo dos Espirituais que desejavam levar o franciscanismo a um rigor excessivo, somado ao milenarismo, donatismo e joaquinismo.


Os principais chefes dos Espirituais foram: Frei Corrado de Offida, Frei João de Parma, Hugo de Digne, Fra Gerardo di Borgo San Donino, Michele di Cesena, Ubertino di Casale, Salimbene, Tomas di Celano.


Os prinicipais erros defendidos pelos Espirituais foram:


1. Sendo São Francisco o maior santo da História, tendo sido ele marcado com os estigmas de Cristo, a regra que ele deixou não poderia ser mudada nem pelo Papa, pois a regra de São Francisco era a lei do Evangelho, e o Papa não tem poder para mudar o Evangelho.


2. A regra da pobreza devia ser absoluta e radicalmente obedecida, e no mesmo grau em que São Francisco a praticara. Por isso, a Ordem franciscana não poderia ter igrejas de pedra, nem conventos. Os frades não poderiam ter livros de missa, de oração ou de estudo. Só poderiam ter um hábito de saco. Este hábito deveria ser usado até cair de podre. O hábito não poderia chegar até os pés, pois que isso seria supérfluo e um luxo desnecessário.


3. Com Frei Hugo de Digne, Frei João de Parma e Frei Gerardo di Borgo San Donino, os erros de Jaoquim de Fiore (1155-1202)-- que já haviam sido condenado no IV Concílio de Latrão -- entraram na ordem franciscana.


4. São Francisco e São Domingos eram as duas testemunhas de que fala o Apocalipse.



5. O Anticristo viria em 1248, e ele seria o Imperador Frederico II., ou um Papa antifranciscano (Por exemplo, João XXII).


6. Haveria um grande castigo, no qual a maior parte dos homens seria eliminada. Mesmo boa parte dos frades franciscanos seria eliminada, sobrevivendo apenas um pequeno resto, que formaria o reino do Espírito Santo (milenarismo).


7. Este reino espiritual seria o dos monges, que substituiria a ordem dos sacerdotes. Viria um grande Papa, o "Pastor Angelicus", que vários Papas pretenderam ser, e um grande Imperador que instaurariam o reino do Espírito Santo.


8. Assim como a Igreja substituíra a Sinagoga, haveria uma Nova igreja espiritual, igualitária (sem hierarquia) e pobre, sem nenhuma propriedade, parecida com a que é preconizada pelo ex-frei Boff e Frei Betto, que substituiria a Igreja rica, fundada por Cristo.


9. A lei de Deus seria abolida, sendo instaurada a lei do Amor.


10. O Evangelho Eterno, de que falava o Abade Joaquim de Fiore, seria o conjunto das obras do abade que se afirmara profeta.


Essas idéias foram expostas na obra de Fra Gerardo di Borgo, Introductorius ad Evangelium Aeternum, publicado em Paris, em 1251, e que foi condenada pelo Papa Alexandre IV, em 1255.


O que tornava os erros dos Espirituais mais perigosos era o fato de que os frades mais famosos pela virtude, pertenciam a essa facção, enquanto seus opositores, geralmente eram mais relaxados. Exceção de valor único foi São Boaventura, que foi eleito Ministro Geral da Ordem, em 1257, e que tomou posição clara contra os erros dos Espirituais, sem ceder em nada aos relaxados. Ele determinou até a prisão de João de Parma, o que lhe valeu a ira dos Espirituais, como Angelo Clareno, que acusou São Boaventura de organizar a quarta perseguição geral contra os "verdadeiros seguidores de São Francisco".


Conclusão


Não podemos ver um erro e ir para o extremo oposto imaginado que isso é o correto ou a verdade. Não é assim que funciona. Em fato, foi assim que surgiu a heresia dos Fraticelli e diversas outras na História da Igreja, por uma reação extrema contra outros erros ou heresias.


Então nós não podemos dizer que a reação correta contra a religião do Vaticano II, o Novus Ordo, i.e., aqueles que insistem que essas pessoas (Montini, Wojtyla, Ratzinger e Bergoglio) são papas materiais e formais, é ir ao extremo oposto e dizer que eles não são nada, nem materialmente, nem formalmente (como fazem os famigerados totalistas).


Então, como podem bispos e padres do movimento tradicional aderirem a uma resposta tão errônea? Ora, isto é simples, mesmos os santos eram em seus juizos particulares, principalmente sobre as pessoas, grupos e movimentos. Os próprios fraticelli são um exemplo vivo disso, pois foram apoiados (até então naquela época só eram acusados de heresia) por um Papa, São Pedro Celestino, que desligou-os de toda obediência com relação à Ordem Franciscana, e autorizou-os a viver nos eremitérios que um Abade da Ordem dos Celestinos devia colocar à disposição deles, para ali observar a Regra e o Testamento de São Francisco. Para não magoar os franciscanos com essas concessões, São Pedro Celestino não permitiu que eles se denominassem Menores ou franciscanos, mas deu a esse novos Eremitas que recebera, o nome de Pobres Eremitas, e os colocou sob a proteção do Cardeal Napoleão Orsini.(Cfr. Gratien, Historia de la Fundación y evolución de la orden de frailes menores en el siglo XIII, Buenos Aires: Desclée, 1947. pag 378).


O triunfo dos hereges Espirituais foi curto: São Pedro Celestino, verificando que era incapaz de governar, renunciou ao papado.


Em 24 de dezembro de 1284, foi eleito Papa, em lugar de São Pedro Celestino, o Cardeal Benedito Gaetani, que tomou o nome de Bonifácio VIII, que era extremamente antigibelino, e contrário aos Espirituais franciscanos.


"Bonifácio VIII logo que cingiu a tiara, anulou todas as concessões de seu predecessor". (Llorca, Garcia Villoslada, Montalban, Historia de la Iglesia Catolica, Madrid: Bac, 1963, vol II, p.562) e os Espirituais caíram de novo em desgraça.


A 8 de abril de 1295, colocou os Espirituais que se haviam refugiado entre os Celestinos,de novo sob a jurisdição do Ministro Geral Franciscano. Depois, pela Bula Ad Augmentum ( Nov. 1295), deu poder ao Ministro Geral de tratar da questão, chegando a proibir aos Espirituais a apelação a Roma porque a questão deles já fora julgada (Cfr. Graciano, Historia de la Fundación y evolución de la orden de frailes menores en el siglo XIII, Buenos Aires: Desclée, 1947. pp. 378-379.).


A luta contra os hereges Espirituais franciscanos não ia terminar ai. Ela se estenderia ainda por muito tempo. A grande condenação contra eles viria a ser pronunciada pelo Papa João XXII, que condenou os erros e heresias dos espirituais em 1318. ( Cfr.os principais erros dos espirituais franciscanos condenados por João XXII in Denzinger 484-490).


Temos que reconhecer a verdade, que é sempre justa e equilibrada, que é que essas pessoas tem a designação, tem a eleição para o papado, na qual se recusam a aceitar.

E por mais que nos incomode ter que dizer isso, isso é verdade. Gostemos ou não, a verdade existe.


Não devemos fazer o que chamamos de "teologia orientada para resultados", i.e., negando a sub ratione Dei. Isso é extremamente perigoso e leva a grandes erros. Não podemos começar com nossa conclusão e trabalhar no sentido contrário, tentando alinhar tudo para se encaixar nessa conclusão. Chamamos isso de "viés de confirmação".


Podemos odiar ter que reconhecer a realidade da situação e adoraríamos ver uma situação normal na Igreja, mas não podemos por causa disso nos recusarmos a reconhecer a situação como ela é de facto.


O próprio Bispo Guérard des Lauriers foi o primeiro a dizer que afirmar que um monstro como Wojtyla era papa material, fazia seus lábios queimarem.



Dado em 31 de Julho no 2023º ano do Senhor, Festa de Santo Inácio de Loyola.



 


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